quinta-feira, 7 de dezembro de 2017



a cada partida
um botão não abre,
privado de vida.
desaba na terra
antes de ser
o que teria sido.

e de tantos abortos e mortes
e tantos medos contidos
de tanto chacoalhar a sorte
no liquidificador de plástico
dos botequins das esquinas
sua tez virou craca de pé
e o tesão virou jaca no chão

perfumando os quintais interioranos
com aroma da podridão das quedas
filha do seu ventre decrépito e profano
com o sal que você semeia sempre
ao pisar em terra alheia, sem dó
nem entranha nem alma,
roubando qualquer inocente,
você segue.

esta faca com cabo entalhado
tem capa de prata incrustada
de brilhante, jade e esmeralda
fica a todo instante de pronto
em sua cintura gingada

quem te protege e te fecha
o corpo para profanidade
e te concede insano
passaporte para a maldade?
É Baco, Zeus, Hades?

esta coroa enrustida
louca para se mostrar
em pintura
ela não se mistura

uma morjana vai um dia
dançar divinamente
e te inebriar, de repente
de baco de noite no vento
vai te contar histórias
de cropped
vai te amarrar no tempo
e te levar a memória

quando estiver no seu auge
luxúria, dinheiro, poder
vai te furar com seu sabre
do lado esquerdo,
certeiro, o sangue vai ser
vermelho,
como gente, sentido,
inteiro.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Até nossas brigas
são em terceira pessoa

Veladas, Discretas, Contidas

Será que um dia
Vamos nos dar as vísceras
E as mãos
Ao invés de trocar
amenidades e deselogios
nas entrelinhas dos bares?

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

tudo que tinha dentro molhou


minha blusa, meus papéis.
meu baralho, meu peito.
meu rg, meus mil réis.
reis nos ralos, frio sem blusa.
baralho com previsão obtusa.


meu pão com queijo
minhas chaves
meu batom, ficou ileso
sequei o espelho na calça
e saí de vermelho,
pela praça.

entrevista

fortes e fracos têm segredos
se você não está pronto para
desvendá-los, não os cutuque
uma fera pode te engolir inteiro.


eu não escrevo sempre a verdade,
só o que sinto.
invento muitas histórias,
mas todas muito sentidas,
com construção de personagem,
não minto.


foi em 2018
não deu dinheiro
mas deu língua,
tiro certeiro.


são ocultos,
pois ocultos não se contam
com números, nem letras
só com sentimentos mesmo,
incomensuráveis.


nem inteligente, nem burra
nem bonita, nem feia
nem tesuda, nem sem sal
mas com cabelo azul, né?!


um pouco santas, um pouco mães, um pouco outras, quem quiserem ser


falem mais foda-se
e fodam mais.
Amores líquidos
Encontros gasosos
Mágoas sólidas


Egos frágeis
Inconscientes transbordantes
Consciências pesadas


Amores frágeis
Mágoas transbordantes
Desencontros estáveis


Identidades volúveis
Apegos egoicos
conta líquida pinga bruta
conta líquida pinga bruta
líquida pinga bruta
pinga bruta
pinga bruta
 

quarta-feira, 18 de outubro de 2017


A morte que respira
Em nós é um pífano
Afinando nossas veias
Para tocar a vida
de pronto


No inverno a vida também segue
debaixo da terra com a semente



Ainda no eterno, onde não alcanço
Ela deve caminhar, talvez mais lento
Ainda que distantes e sem tez
Nos damos as mãos no horizonte
E procuramos dar um sentido
Para os sopros.


Por isso os pífanos derramam-se
juntos em Caruaru, numa prece
Por isso meu cajueiro
quer dar flor e caju todo dia

O canto que assopra
de um lado com vida
Chega do outro
no fim
do pífano
Em dó
menor

e os filhos crescem
na primavera
tecendo as notas
que ficaram

quarta-feira, 27 de setembro de 2017



Ser anônimo, sem registro
dos dias em que fui extremamente feliz
Ser servil enquanto deveria sentar ao seu lado
E perdoar os anos que você não me viu
Te olhando


Ser discreta, quando queria gritar
Com a porta aberta
Meu tesão
Ser direta, quando queria te dengar
Com poesia recitada de frente para o mar


Conter meu abraço, meu gozo
E me esconder na multidão
Enquanto meus poros desejam
E meus olhos derramam sentir
Porque as grades que me cerceiam
São as veias do coração


29/01/2017

Para sentir, use preservativo


17/09/2016
21:59
Eu sou um ser intenso e de mente aberta. Busco me livrar de preconceitos e viver grandes emoções. Viver com adrenalina e com paz é uma equação difícil de resolver. Mas garanto que é andar com o coração na frente, a intuição no meio e a cabeça na retaguarda. Funciona? Não sei. Tem uns 37 anos e quase oito que tenho testado esta fórmula very crazy of life.
E o tema aqui é relacionamento, matéria que todo mundo repete mil vezes de ano. Estatísticas péssimas, humanidade faz um clone do homem, mas não consegue programar como se relacionar com ele.
De minhas experiências, nem muitas nem poucas, digo que na maioria das vezes andei com o coração na frente. Vocês devem estar se perguntando se deu certo, questão comum. Relacionamentos não foram feitos para dar certo, mas apenas para se viver. A vida dá certo quando estamos keep moving, em gerúndio, experimentando, aprendendo.
Eu penso ser mais válido aquele amor em que a gente se joga, onde cabe o incondicional e foda-se. Quando dizemos eu te amo sem ter certeza da resposta ou sabendo que não tem correspondência. Naquela relação em que usamos todas as cartas, todas as jogadas e em que esperamos, acendemos velas e sonhamos por anos. Ali mora o amor verdadeiro, quase desprovido de ego. Vocês vão me dizer que sou suicida. Não, sou intensa, sou inteira.  Eu amo e ponto. Se o outro me ama ou não é um problema dele e não meu. Faço meu melhor, na maioria das vezes. Quando o cara está de sacanagem, faço meus 80%, rs, porque também sou de carne e me decepciono, sim. Decepciono-me com gente que não sabe se doar, com gente sem afeto, gente seca que não gosta de trocar, que tem medo de ser frágil e de falar de seus podres. Eu me frustro com egoísmo, crueldade, mentira e superficialidade.
E quando faço meus 100% fico muito mais feliz. E com meus 150% eu explodo de felicidade. Doar amor tem retorno, vem de quem doa para o mundo e para si mesmo. Às vezes ele vem em forma de amizade, de amor universal, de auto-estima ou de aprendizado. Este é o verdadeiro motivo de se estar vivo.
O problema deste nosso tempo que cultua a liberdade e a felicidade é que as pessoas nem sabem o que significa sentir. Sentimentos são alienígenas, melhor que fiquem em Marte, ninguém quer tomar contato com um cara estranho que desvirtua a direção egoísta de nossas vidas porque sentir tem efeito colateral, a dor. Ela incomoda, tira a gente do prumo, faz pensar no sentido desta bagaça aqui. Não traz produtividade, nem felicidade garantida. Sentir não é seguro, para conjugar o verbo precisa-se de preservativo.
Assim o povo trocou o verbo amar pelo verbo foder. Foda-se é a expressão da moda e é sinônimo de liberdade. Sexo não é mais tabu, é saúde, é banal, corriqueiro, é egoísta. Eu fodo e os outros que se fodam.
Toda a troca de uma relação amorosa que culmina no ato sexual sublime e iluminado que repõe e transmuta energias é simplesmente transformado numa foda. Sem trocas, um ato maquinal, o ato de devorar pessoas, como se devora as informações na era da internet. Com direito a nudes, claro, a alma não estava lá, mas o corpo sim. Precisa registrar.
Qual o sentido desta liberdade vazia de alma? Quem é livre e feliz sem conhecer nem entrar em contato com suas emoções?
Não defendo relações tradicionais, e sim com profundidade, relações com troca de verdade. Vamos deixar que o foda-se caia de moda, a humanidade precisa evoluir. Uma dose de coragem e liguem o ama-se.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

mar morto
umbigo em trevas
absorto


sem trégua
minha sombra vem
comigo

revolto
ventre sem feto e sem
aborto

fardo em meus
braços
as linhas da
Vida

Tempo
Sem teto
Gente
Sentida

Barco sem
Bússola
No vento forte
À deriva

Umbigo morto
Ventre preso
Braço sem gente
Linha partida

Sem trégua
Sem tempo
Sem vida

O Verdadeiro Fruto do Conhecimento





Para os gregos existem três tipos de amor, philos: donde vem a palavra “filantropia” é o amor fraterno; eros: radical de “erótico” que pode ser o amor carnal, sensual, platônico ou romântico; e agapé: amor espiritual, divino, transcendente. Acho que nós ocidentais, somos em partes, filhos da civilização greco-romana e é fácil reconhecer esta herança em nossos arquétipos e compreensão de mundo.
Já escutei uma psicóloga falar (não sei se ela vai gostar da citação do nome, rs) que nos deram o amor para sobreviver ao karma, como um prêmio ou uma distração. Eu acredito ao contrário, que o maior karma da humanidade é o amor. Trabalhar os afetos é árduo em qualquer instância, philos, eros, isso sem nem falar de agapé, acho que somente pessoas como Cristo, Maomé, Buda, gente deste naipe, puderam tocar o tão transcendente e nirvânico agapé.
O amor perpassa toda relação afetiva e, às vezes se manisfesta como ódio, posse, controle, ciúme, bengala, espelho, interesse, sentimentos que a princípio desenham-se tão egoístas e tão distantes do ideal do amor, não é mesmo? A abordagem psicológica de encontro de um ser no outro ou a espiritual de karma, parecem-me as duas explicações mais plausíveis para nossas associações afetivas. Creio que estamos na vida para aprender e enxergamos em nossos pares, amigos, pessoas próximas nossas próprias falhas, qualidades, pontos a melhorar e fortalecer.  Para mim, philos e eros são mundanos demais e, nem podem ser chamados de amor.
Sempre estamos envolvidos em relações de afeto, somos seres gregários, seja ela em família, amigos, parceiro romântico ou de cama por conta de uma transferência, ou seja, uma projeção de um si mesmo no outro ou por karma, algo que fizemos de errado em outras vidas e temos que corrigir nesta, ou algo bem realizado onde somos premiados. Isso é tão seco e parece ser tão interesseiro e racional que pessoas fofinhas que distribuem corações no dia dos namorados vão me xingar de egoísta, amarga e sem sentimentos.
Eu também sofro e me dedico por amor. Já tomei as atitudes mais estúpidas da vida em nome deste tão aclamado substantivo que toma nossa psique e invade nossas vidas como um ladrão. Por amor posso perder uma noite de sono preocupada se meu afeto chegou em casa bem ou não, sentir a dor da saudade apunhalando meu peito e me partindo ao meio, largar meu emprego e fugir com uma trouxa para morar numa cabana no pólo norte, gastar dinheiro pagando algo para alguém que gosto, varar noites no hospital, fazer bolo, sopa e macarrão, cafuné, dar muito abraço e carinho. Meu coração palpita pelos meus afetos, eles fazem parte da minha vida, eu não sou insensível, sou tocada por eles como qualquer ser normal, dotado de coração, ou de alma, como diriam os russos.
Porém penso sempre, “por que motivos eu me liguei a esta pessoa que está ao meu lado?” e minha resposta é: “porque tenho estes e mais estes pontos para aprender com ela e estes e estes outros pontos a ensiná-la.” A isso dou nome de interesse egoísta de aprendizagem ou projeção manipuladora do meu inconsciente ou processo kármico. Projeção ou karma? Não sei. Só sinto que as relações são o quinhão mais difícil da vida, com elas todos nós sofremos, ninguém se salva, pois para crescer e evoluir é necessário que nos desapeguemos de padrões, hábitos e características que às vezes nos definem ou nos são caras demais.
Aprender é transcender e apesar do ganho ser gigantesco, deixamos neste processo nossa criança para trás e crescemos. É duro se tornar consciente e adulto e tomar a frente da nossa força-tarefa aqui na Terra, exige trabalho psicológico e prático extenuante, dá preguiça até de passar perto de tanta encrenca. Por isso tanta gente foge do amor (mas deixemos este tema para outro texto, rs). Amar é trocar conhecimento e experiência com objetivo de evoluir, através de carinho, companheirismo, cumplicidade e muita, mas muita dor. Mas, talvez, se tentarmos de verdade, a lagarta possa voar em borboleta e philos mais quiçá trisquem com a ponta dos dedos agapé.
Um fato
Dois sujeitos
Duas verdades

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

queria correr,
mas não deu tempo
me cabe
dentro
da sua
biblio
teca?
socar
o oco
verter
o suco
quebrar
o coco
falar
no vácuo
olhar
sem eco
amar
tão pouco


fazer
desfeita

furar
com furacão

suceder
insucesso

picar
com o facão


cometer
o incomensurável
não tem mais madrugada
para caber tanta palavra
as gavetas estão todas lotadas
não estacione, dizem as placas

esperança, não era para esperar?
não. era pra pegar estrada.
chutou as gavetas da cômoda
botou a mochila nas costas
e saiu da vida sem mapa
choveu na lata
e o desespero gotejou
sem esperança
nem saudade
o silêncio de tarde

o desespero gotejava lento,
esperou amanhecer.

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Atravessei na contramão
dispensei o contrabaixo
revirei o alçapão
saí vagando cabisbaixo,
sem sapato, sem visão





não se avexe com os pães
pois a vida deve ser de sins
não jogue a alma para os cães
o sofrer tem sempre um fim





da panela da vizinha
sai perfume de cozinha
de vó velha que matuta
no tacho uma poção





da minha estante uma caixinha
é a ciranda, cirandinha
de alma nova aprendendo
a girar com o salão



não vá dizer que fui fugaz
as coisas que a gente faz
têm razão


não vá dizer que quero mais
a ciranda anda rodando,
devolvendo o que é meu
de coração





Que raios tinha de ser
só saberei ao amanhecer
na voz das rosas brancas da janela
com café e boa-nova de jornal
sem meia luz, sem sentinela








enquanto isso vou girando
vou girando, vou girando
a colher de pau, descalço
o que virá a ser de fato
está no verso não escrito
da roda lia de meu palco






Este exagero sagitariano
Nos exaspera sem medo
Nos jogamos no abismo
De ponta cabeça
Sentindo o vento no peito

Este desespero em viver
abraçando tudo junto
Ao mesmo tempo
Com os braços e as pernas


Com o corpo quente
a profundidade das vísceras
e da alma latente



E este desapego
que fala foda-se fácil
e coloca o pé na estrada
De novo



Queremos ir lá

Para viver o agora
Com todos os poros
Como se não existissem
outras vidas

Como não se bastasse o sangue
em nossas veias para correr
Livre nos campos,
Sentimos sede
Brilhamos com o sol
 


Sentimos com lupa
tem quem não crê
diminui nosso sentir
chama de drama
de novela mexicana
mas nós
não vivemos pela metade
mas nós
não sabemos esconder
a verdade

Este exagero sagitariano
este desespero em viver
com as vísceras
esta coragem de arqueiro
com todos os poros
inteiro 

 


Quem admira só
minhas qualidades não
me ama, na verdade

sábado, 26 de agosto de 2017


Amor líquido
Seres fugindo
Dos seus vazios


Amor romântico
Seres investindo
Em suas ilusões

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Hoje comi arroz com agrião
Porque você me aconselhou
No pé do ouvido ao violão
E talvez tenha me convencido
Com o carinho da suas mãos
Tãos másculas e tão sensitivas
Que posso tentar limpar meu pulmão
A cura nunca é doce
Mas quando me aqueço
Com sua pele rubra
Percebo que a vida
Em mim
Pode ter um novo começo
Uma poesia às vezes são só palavras
E noutras são um sopro de arpa
No pulmão, como o agrião
Pode nem ser tão áspero
Quanto esperado
E a muda esgotada de andanças
Por terras insalubres
É tocada de seiva
E abre os olhos
Meu coração faz
Sala pro seu, mas você
Só traz a fala

Coração empacado
 defunto frio, sem fala
Alma penada
Alma empacada
Em beco mudo, inverno
Corpo penado
Se de madrugada eu te procuro
é porque ando buscando meu escuro
e se ao amanhecer a água de meu copo é turva
é porque eu enxergo mais sem luz,
e o terror me habita a tarde inteira
por trás do espelho e das vísceras.
E a nódoa destes ventos intrépidos
vincaram o corpo, dobraram as árvores.
E se você não vê que também somou para esta veste negra e esta vista lânguida
é porque vai semear mais peste pelos campos
e quando o perfume das flores mortas baterem na sua porta,
será um eco longo e certo
pelos canteiros de vento
A morte eterna embalsamará o pranto
no murmúrio dos troncos de todo inverno

sábado, 19 de agosto de 2017


Eu quero voltar a ser menina
Pro gosto da tangerina
Cair do pé em minha boca




Eu quero voltar a ser menina
Pra lamber doce no tacho
Do fogão de minha vó




Eu quero voltar a ser menina
Pra subir uma colina
E descer de escorregador




Eu quero voltar a ser menina
Pra bordar a minha sina
Virar estrela na campina
E sonhar com um amor




Eu quero voltar a ser menina
Ter retina cristalina
E ver o mundo sem pavor







Eu quero me deitar, rolar na grama
Pôr pau de fogueira em chama
E fazer olé pra boi



Eu quero é brincar de faz de conta
Contar estrela e perder a conta
viajar de tapete voador




Eu quero o meu verso na viola
Protagonizar minha história
Distribuir muito calor




Eu quero partilhar o que já vi
dança, vislumbre, sentir
Me surpreender com ti






segunda-feira, 14 de agosto de 2017

parmesão com mel e gengibre
é o timbre do vento no corpo
com sol com céu com mar

os lobos uivam
juntos de madrugada
as solidões


guerreiro também
precisa saber rezar

hoje me decidi:
não farei no inverno
planos, nem no verão...


deixarei que se aproximem
da minha pele as estações
sem pressa, sem delongas
só o tempo necessário
para elas serem e sem querer
giz em minha lousa,
fiz a Primavera, louca
para ela vir... 







às vezes suspendemos o tempo
sem pauta
E o mundo vem sozinho em sol maior

nos tocar
Expor ao inverno
Tua parte mais Frágil,
Corpo Guerreiro

domingo, 13 de agosto de 2017

dormir junto é
compartilhar no inverno
o inconsciente
eu ando sempre
esperando o perfume
do jasmim chegar
sonhar sem querer
com você é muita
intimidade

música

até quando vai?
vamos?
voar no além-mar
juntos
eu não quero mais
léguas
esta língua muda
e rastros



o céu está turvo
morro
tempo de acender
as velas
se você não quer
te mato
sopro de dragão

corro pela praia, nado
voo de horizonte, jato
revolvo a areia, marcos
sigo para o fronte

me espere lá
que eu vou
me espere lá que eu vou
me espere lá...
esta espera às vezes
me olha e ri de mim
esta entrega às vezes
me come e eu fico engolida
esta prega no meu caderno
de desenho me dá gastura

a bodega pega fogo de noite
e a gente finge que não
desenterra o passado, cavuca com a mão a ferida
faz suco da minha alma
que as letras de seu nome ainda saem com vida

dou canja na festa destes vizinhos chatos
faço fita e finjo que não
queria chorar, mas distribuo sorrisos e abraços

padeço tão serenamente
quando sei que fogo sem fim é a vida
e me alenta o peito


vou por este caminho de pedra íngreme e áspera,
pois o destino me catou e me largou
nesta via certa de percalço
sigo cega e descalça
talvez meus pés saibam


não me des
espero
me espanto
com tanta paz
com tão sem pranto
será que estou sendo sem saber?
um tiquinho do céu

Reinventando minha cidade

outros e mesmos caminhos possíveis
a cidade dentro da cidade
olhar estrangeiro

me perdi

e me encontro estrangeiro
dentro da minha própria cidade
tem gosto de pitomba com água da chuva
e cheiro
de café coado na hora do adeus

e as tranças, os becos
os caminhos possíveis

são minha metade perdida
esparsa nos cantos

sento na guia
e olho o infinito
ser turista dentro de mim
tomar café com minhas vazantes
e me sentir repleta

porque cada beco
tem uma parte
de minha mônada
e posso aprender

com as paredes
os musgos
as guias
e este desorizonte enevoado


é sempre bom
andar à esmo
tomar café com vazio
e sentir sabores
desconhecidos

é sempre bom
se perder
se deparar com abismos
e ter que reinventar
nossa própria cidade


mar morto
umbigo em trevas
absorto


sem trégua
minha sombra vem
comigo

revolto
ventre sem feto e sem
aborto

fardo em meus
braços
as linhas da
vida

tempo
sem teto
gente
sentida

barco sem
bússola
no vento forte
à deriva

umbigo morto
ventre preso
braço sem gente
linha partida

sem trégua
sem tempo sem corpo
a sombra
caminha